Descubra o que é alopecia e a luta da Jada Smith contra essa condição


  • Criado por: Adriana Diniz
  • Postado em: 31/03/2022

Na noite do Oscar de 2022, que ocorreu no domingo (27/03), o ator Will Smith surpreendeu a todos ao dar um tapa no comediante Chris Rock, que estava apresentando o evento na ocasião. Essa cena se sucedeu em virtude de uma piada que Chris havia feito ao comparar a esposa de Will, Jada Pinkett Smith, a G. I. Jane, uma personagem feminina calva interpretada por Demi Moore. Ainda que esse episódio tenha despertado diversas discussões sobre a violência e os limites do humor, é importante ressaltar que Jada raspa o cabelo em razão de uma doença, denominada alopecia, a qual afetou severamente sua autoestima. Apesar de, em muitos casos, ser temporária, a doença também pode ser permanente, como é o caso da atriz.

Compreender a condição que Jada sofre, com todas suas implicações, é essencial para tornar o debate mais honesto. Saiba, a seguir, algumas informações importantes sobre alopecia e como ela afeta, sobretudo, a autoestima de mulheres negras:

O que é alopecia e quais são seus tipos e suas causas

Alopecia é uma interrupção do crescimento normal dos cabelos, causando perda de fios em qualquer parte do corpo, sendo mais comum no couro cabeludo. É normal que ocorra uma queda de 50 a 100 fios todos os dias, entretanto uma quantidade maior do que essa já pode ser considerada uma questão médica. As causas para alopecia são diversas, variando desde estresse até doenças autoimunes. Vejamos os tipos da doença a seguir.

Tipos de alopecia

Alopecia androgenética: Com origem genética, trata-se do tipo mais comum de alopecia. Ainda que se inicie na adolescência ou no início da vida adulta, só se torna mais proeminente entre os 40 e os 50 anos. É mais comum entre os homens, que têm 50% de chance de desenvolver a doença, mas também aparece em 25% das mulheres.

Alopecia areata: Trata-se de uma doença autoimune, isto é, uma condição em que o mecanismo de defesa do organismo ataca a si próprio. No caso da alopecia, as células de defesa do corpo atacam o folículo capilar, impedindo-o de produzir novos fios. Esse distúrbio é mais comum em pessoas com menos de 20 anos, mas pode ocorrer em pessoas mais velhas. Essa condição pode ser associada a fatores genéticos ou estresse. Também é comum em quem sofre com lúpus e vitiligo.

Alopecia por tração: Ocorre quando o indivíduo utiliza penteados muito pesados, que exigem muito dos fios. Pode ser temporário, mas em alguns casos, dependendo do dano causado, a condição se torna permanente.

Eflúvio telógeno: Esse tipo se caracteriza por perda significativa – cerca de 300 a 500 fios por dia –, entretanto é reversível. Seria causada por condições médicas, como estresse, distúrbios da tireoide, deficiência de vitaminas, febre e até mesmo covid-19.

Alopecia cicatricial: É o tipo mais raro, mas ainda presente em muitos pacientes, e se caracteriza pela inflamação e pelo crescimento de tecido cicatricial, ocasionando o impedimento de formação de novos fios no local.

É importante salientar que somente um médico pode avaliar e diagnosticar qual tipo de alopecia um paciente possui e indicar seus possíveis tratamentos. A automedicação sem acompanhamento profissional adequado pode não só piorar o quadro como causar outros problemas de saúde ainda mais graves.

Alopecia feminina e a autoestima de mulheres negras

Segundo um estudo no Jornal Internacional de Dermatologia, cerca de 11% de mulheres de origem africana são afetadas pela alopecia, em comparação a 5% de mulheres de outras etnias. Isso se deve a uma predisposição genética, mas também ao intenso uso de produtos químicos que não são feitos pensando nas condições específicas de mulheres de ancestralidade africana.

Esse problema esbarra em várias questões delicadas envolvendo o racismo e o machismo que sofrem as mulheres negras. Qualquer mulher, seja qual for sua etnia, sofre com pressões estéticas que definem um ideal inalcançável de feminilidade, que envolve características como magreza excessiva, cabelos lisos e longos, olhos redondos e grandes, além de, claro, pele branca e levemente rosada. Certamente mulheres negras não podem mudar a cor da pele e, por isso, já são automaticamente consideradas menos femininas pela sociedade. Desse modo, existe um árduo esforço – ainda que inconsciente e pouco discutido – dessas mulheres em fazer o máximo para se adequar às demais exigências. Uma das mais importantes é, justamente, o cabelo.

Desde crianças, as pessoas negras são diminuídas pela textura de seus cabelos. Os homens negros, nesse caso, encontram a alternativa de raspá-los, já que o cabelo curto é bem aceito no padrão masculino. As mulheres, porém, precisam mantê-los longos e sem volume se quiserem ser consideradas minimamente femininas. Assim se acostumam a passar produtos químicos fortes em seus cabelos, que danificam os fios, para conseguir alisá-los. Além disso, mesmo as mulheres que decidem assumi-los crespos encontram dificuldade em encontrar produtos que não fragilizem seus cabelos, já que as empresas de cosméticos dificilmente baseiam seus produtos em consumidoras negras.

Tudo isso não só permite que mulheres sejam submetidas a toxinas que podem afetar vários órgãos do seu corpo, como também as deixa vulneráveis à alopecia, sobretudo a permanente. Isso afeta profundamente sua autoestima, uma vez que encontram mais dificuldade de serem consideradas uma mulher para as pessoas ao seu redor. Para uma mulher negra, seu cabelo representa sua força e, portanto, ver-se sem ele faz com que se sinta fraca, sem espaço no mundo em que vive. Esse problema na autoestima se torna ainda mais grave visto que há pouquíssimas mulheres negras calvas na mídia, fazendo com que as que sofrem dessa condição se sintam ainda mais sozinhas.

Além disso, é importante ressaltar que parte do tratamento da alopecia é a proibição da cobertura da área afetada, ou seja, as mulheres não podem usar perucas ou cobrir a cabeça de qualquer outra forma. Isso gera ainda mais isolamento para elas, que não querem mais sair de casa nem serem vistas por ninguém.

Jada Smith e sua longa batalha

Jada Pinkett Smith é uma atriz, cantora e empresária estadunidense, nascida em 18 de setembro de 1971. É conhecida por diversos filmes, como “Matrix: The Matrix Reloaded”, e sua dublagem na animação “Madagascar”.

Já há alguns anos, a atriz sofre de alopecia areata em razão de uma doença autoimune. Sua jornada de autoaceitação não foi fácil. Passou muito tempo com dificuldade de sair de casa e se apresentar como uma figura pública, ainda mais sendo mulher e negra. Hoje em dia, ela relata sua condição em suas redes sociais e tenta levá-la com leveza, brincando que vai colocar joias no couro cabeludo e essa será sua coroa.

Um ponto fundamental para a autoaceitação de Jada foi o generoso gesto de sua filha, Willow. Esta também teria raspado os cabelos em solidariedade à mãe, para que não se sentisse tão sozinha. Portanto é possível ver como ter mulheres negras apoiando outras mulheres negras – principalmente quando são da própria família – é essencial para a reconstrução de suas autoestimas.

O que eu posso fazer?

Se você também sofre dessa condição e sente dificuldade em aceitar sua nova aparência, o primeiro passo é não se culpar. A importância que nosso cabelo tem em nossa sociedade é muito mais estrutural e antiga do se pode imaginar, sendo muito difícil se desvencilhar da necessidade de ter um cabelo “apresentável” para ser considerada uma mulher. Entretanto se basear na história de Jada e de várias outras mulheres que também passam pelo mesmo problema provavelmente vai lhe dar forças que você nem sabia que existiam.

Neste momento, a melhor maneira de lidar com a situação é, além de se consultar com um médico, voltar-se à espiritualidade e, sobretudo, à sua ancestralidade e a toda a força feminina que ajuda a formar quem você é. Conectar-se com essa energia ancestral é uma forma muito eficiente e potente de reencontrar sua autoestima e, acima de tudo, garantir a autoestima das novas gerações de meninas negras.

Confusão no Oscar 2022

A agressão que Will Smith cometeu na cerimônia do Oscar de 2022 contra Chris Rock, portanto, não foi injustificada. Ainda que houvesse outras maneiras de resolver a situação, Will soube que sua esposa precisava ser defendida, pois sua condição não é uma piada. Além disso, brincar com essa situação não é só ofender especificamente a Jada, mas todas as mulheres que sofrem do mesmo distúrbio e precisam ouvir as mesmas ofensas todos os dias. Essa confusão no Oscar, ao menos, serve para alertar as pessoas sobre os perigos de uma piada mal pensada e sobre como as mulheres negras também precisam e merecem ser defendidas de violências emocionais, como a que Jada sofreu de Chris Rock.